Por Jorge Santana*
Com as ruas entupidas de carros, engarrafamentos gigantescos mesmo em cidades de médio porte e o transporte coletivo sempre deficiente, mobilidade urbana virou a temática da moda, sobretudo em véspera de eleição municipal, período onde se proliferam as mais falsas e inexequíveis promessas.
Que tal simplificar essa história, didaticamente? Então vamos ser
cartesianos ao examinar o problema, buscando as suas causas e as
possíveis soluções.
Nas economias desenvolvidas, e agora também nas emergentes, os carros
sempre foram sonhos de consumo. Quanto mais acessíveis, mais
consumidores se tornam felizes e exigentes proprietários de veículos. A
primeira das exigências: quem tem carro quer ter o privilégio de andar
em vias sem conviver com engarrafamentos e trânsito lento, daí exigir
que as administrações públicas se virem para construir viadutos e novas
vias, enlanguescer outras, enfim, gastar fortunas dos seus limitados
orçamentos em obras cada vez mais complexas e caras.
Como esses setores da sociedade são influentes, terminam por pautar a
mídia e os políticos, fazendo com que todos, como se papagaios fossem,
fiquem a repetir pseudo-soluções sem se dar ao trabalho de se debruçar
sobre sua efetividade.
Com a entrada em circulação de 3,5 milhões de novos veículos por ano
nas cidades brasileiras, as "soluções" apresentadas para resolver o
problema da mobilidade urbana equivalem a enxugar gelo: uma intervenção
urbana ameniza o problema aqui, até que, pouco tempo depois, ele
reaparece mais à frente.
Feita essa opção por tentar dar comodidade ao transporte individual,
sacrificam-se os investimentos no transporte coletivo. No Brasil essa
obtusidade é mais acentuada e eis o maior exemplo: a maior malha de
metrô do país, em São Paulo, tem 74 km, enquanto Santiago do Chile, com
menos da metade da população, tem 94 km. Basta dirigir um carro nas duas
cidades para perceber o que significa essa diferença.
Para completar essa tragédia urbana, o lobby da indústria
automobilística sempre consegue fazer com que o governo adote medidas
que garantam suas vendas (sobretudo as recorrentes desonerações
tributárias) sem, obviamente, afetar as abusivas margens de lucro (os
carros mais caros do planeta proporcionam as maiores lucratividades). É
fato que a carga tributária brasileira é estratosférica, mas reduzí-la
para setores que abusam dos preços é prejudicar os potenciais
beneficiários dos impostos, ou seja, a sociedade.
Há ainda outro agravante: a proliferação indiscriminada, e sob o olhar
complascente dos órgãos de trânsito, de toda espécie de veículos
motorizados de duas rodas, pilotados por kamikazes que ajudam a
infernizar o trânsito das cidades e a engordar as estatísticas de
acidentes de trânsito.
Em resumo, o modelo que adotamos no Brasil não vai resolver, sequer
minimizar, a problemática da mobilidade urbana. Pior, sem investimentos
no transporte coletivo, restará o amargo remédio da adoção de medidas
restritivas ao livre trânsito, como os já comuns pedágios urbanos
adotados em algumas metrópoles do mundo.
E por fim, mas não menos importante, recomendo poupar seus ouvidos
sempre que algum político oportunista apresentar proposta mirabolante
para enfrentar o pré-colapso da mobilidade urbana nas cidades
brasileiras.
*engenheiro e empresário.
Fonte: Blog Claudio Nunes(Portal Infonet)