sexta-feira, 5 de julho de 2013

Professor da UFRN aponta meios para subsidiar tarifa zero em Natal

A proposta de tarifa zero no transporte público é possível e tem alternativas para acontecer em Natal e no Brasil. A opinião é do engenheiro civil e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Rubens Barreto Ramos, que defende a implantação de um sistema de transporte plenamente subsidiado e gratuito para todos. Os subsídios para viabilizar a proposta, segundo Ramos, podem vir de diversas formas, no entanto para que a teoria vire prática é preciso que haja mudança na mentalidade dos governantes em relação ao modelo adotado atualmente.

A tese do professor parte do princípio que o transporte não consegue sobreviver como serviço tarifado, que é exatamente o modelo adotado na maioria das cidades brasileiras. "Por definição, todo produto de mercado é excludente e produz disputa. O transporte público tarifado só acontece quando o usuário não tem opção. Quando a renda aumenta e as pessoas compram veículos, elas abandonam rapidamente o transporte pago. Assim o serviço perde a capacidade de ser vendável" explica.

Em Natal, o sistema de transporte é 100% bancado pelos usuários. O dinheiro arrecadado com o pagamento da passagem é o mesmo que paga gratuidades e meia entradas. Além disso, seguindo a lógica da tarifa, o especialista entende que o preço da passagem sempre estará pressionado pelos custos para se manter o sistema.  Para Ramos, o transporte tem de ser visto da mesma forma que setores como saúde, educação e segurança, que são pagos pela sociedade.

"É o único serviço público que não é rateado pela sociedade e quem paga é o usuário. As manifestações estão ajudando a mudar essa mentalidade. O interesse da cidade é ter a máxima mobilidade suficiente, que é um sistema de transporte em que as pessoas possam usar e pagar pouco. Atualmente existe o pensamento de que o transporte é para todos, mas o funcionamento ocorre em uma lógica privada", opina.

Alternativas
Na pesquisa do pós-doutorado, o especialista fez um levantamento sobre cidades do mundo que subsidiam as tarifas de transporte. Nos lugares pesquisados ocorreu processo similar ao que acontece há alguns anos no Brasil, com a troca do transporte público pelo individual a medida que a renda das pessoas aumentou. Com o tempo, os governos optaram por conceder subsídios para estimular a volta ao transporte público.

De acordo com o especialista, o custo operacional do sistema de transporte gira em torno dos R$ 200 milhões. Desta conta, 44% é pago em dinheiro e passes, 40% via vale transporte e 17% por estudantes. Ramos sugere a transformação do vale transporte em subsídio, o que já pagaria R$ 80 milhões. Sobrariam então R$ 120 milhões, que no entendimento de Ramos podem ser abatidos de diversas formas.

Entre as alternativas possíveis para subsidiar a tarifa mais barata, o engenheiro civil destaca a tributação do combustível do transporte individual. De acordo com o professor, foram consumidos cerca de 300 milhões de litros de gasolina e etanol na cidade em 2012. Simulando a cobrança de um imposto que impacte em R$ 0,10 por litro de gasolina consumido, o professor calcula que seria possível arrecadar R$ 30 milhões para o subsídio da passagem.

"O gasto semanal para uma pessoa que percorre dez quilômetros por semana ficaria entre R$ 2,50 a R$ 3,50", contabiliza. Com a alocação citada já seria possível garantir o passe livre para estudantes, que com a meia entrada consomem atualmente cerca de R$ 30 milhões do custo total do sistema de transporte.

Outra proposta é alocar R$ 100 do Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) dos carros, que é cobrado anualmente. Levando em conta que Natal tem cerca de 200 mil carros,  número que deve ser atingido ainda neste ano, seria possível arrecadar mais R$ 20 milhões para subsidiar a tarifa. Se cobrados outros R$ 55 do IPVA das motos seriam R$ 4 milhões com as cerca de 70 mil motos que circulam na capital potiguar.

Projeto propõe uso de lucros de empresas
Está em análise na Câmara Municipal um projeto de lei que estabelece o passe livre para estudantes e trabalhadores desempregados no transporte urbano de Natal. O projeto define ainda que a gratuidade seja concedida em todos os dias e horários da semana, sem limite diário de viagens. A proposta foi elaborada pelos vereadores Amanda Gurgel (PSTU), Sandro Pimentel e Marcos Antônio (ambos do Psol).

O financiamento do passe livre se dará através de dotações financeiras próprias, previstas no orçamento; por meio da destinação de um percentual da taxa anual de lucros das empresas do setor de transporte; e da suspensão do repasse da prefeitura para as instituições sem fins lucrativos, destinando esses valores para o objeto da lei.

Desoneração não melhora qualidade
Para baixar o preço da tarifa, a saída encontrada pelo prefeito de Natal, Carlos Eduardo Alves, foi a desoneração de impostos federais Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Na época, foi possível reduzir a passagem de R$ 2,40 para R$ 2,30. Depois o prefeito baixou a tarifa para R$ 2,20, mas não especificou de que forma a redução foi bancada. Para o professor Rubens Ramos, a desoneração de tributos não é a melhor opção. "Retirar o imposto só tem efeito de curto prazo, pois os custos vão continuar crescendo", diz.

Antes da redução para os atuais R$ 2,20, os secretários de Tributação do Estado e Município já haviam alertado que além de ferir fortemente os cofres públicos, as desonerações podem ser usadas em uma nova composição da tarifa, mas não garantem a aplicação do valor da renúncia fiscal em melhorias no transporte urbano, algo que depende atualmente da ação das empresas que possuem a concessão pública da prefeitura para prestar o serviço de transporte urbano na cidade.

Seis empresas operam o sistema de transporte por meio de permissões assinadas com o Município. A própria Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob) reconhece que os contratos não garantem a qualidade. "Os contratos dizem basicamente que as empresas têm de operar de forma eficiente, mas não diz como isso vai ser medido. Com a licitação do transporte, teremos meios para medir eficiência e até penalizar em casos de descumprimento", diz a técnica do Departamento de Estudos e Projetos da Semob, Rejane Xavier.

Com o projeto de lei autorizativa da licitação enviado em meados de junho pelo prefeito Carlos Eduardo, a Câmara Municipal de Natal definiu um calendário entre os dias 22 e 31 de julho para as audiências e votações da licitação do sistema de transporte. Para o professor Rubens Ramos, antes de discutir a licitação, é necessário rever o sistema de transporte em uma linha moderna. "O sistema é antigo e obsoleto. O transporte não se adequou às mudanças da cidade. Com o esquema que temos atualmente, a licitação será fazer mais do mesmo", alerta.

Ao invés dos altos investimentos em obras de mobilidade urbana, o engenheiro acredita que é preciso priorizar o transporte público. Na opinião de Ramos, a opção mais interessante para Natal é montar um sistema que integre o Tramway, mais conhecido no Brasil como Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT), com os ônibus da cidade. "O ideal seria ter uma linha cruzando a cidade e os ônibus fazendo o papel de integração dos bairros", esclarece o professor, que vem aprofundando uma pesquisa sobre essa proposta para o transporte público da cidade.

Fonte: G1

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